Experimentos em tubo de choque de alta pressão
Tubo de choque (Shock Tube – ST)
O tubo de choque é um é uma bancada de testes composta principalmente por duas seções de tubos conectados axialmente por uma divisão física chamada de diafragma. Uma destas duas seções é chamada de “Seção de alta pressão” (Driver section) e a outra e mais importante é chamada de “Seção de baixa pressão” (Driven section). Em um experimento típico de tubo de choque, o diafragma abre (é rompido ou aberto por ação mecânica) gerando um gradiente de pressão axial entre as duas seções tubulares. Este gradiente de pressão gera a propagação de uma onda de choque que se descola na direção da seção de teste ou seção de baixa pressão (onda de choque incidente) e posteriormente esta onda de choque chega ao final da seção de teste e é refletida, gerando uma segunda onda de choque, a onda de choque refletida.
De forma global, os tubos de choque podem ser classificados em dois grandes grupos:
- Tubos de choque de alta pressão – (High Pressure Shock Tube – HPST)
- Tubos de choque de baixa pressão
Tubos de choque podem ser construídos em varias configurações, porém, as formas mais comuns são as seguintes:
- Tubo de choque de diafragma simples
- Tubo de choque de diafragma duplo
Em estas quatro classificações, podem ser construídos tubos de choque de pulso simples (single-pulse shock tube), túnel de choque (shock tunnel), etc. A figura 1 mostra a configuração básica de um tubo de choque de alta pressão, neste caso, uma configuração similar à configuração do tubo de choque de alta pressão da Universidade de Duisburg-Essen na Alemanha. Este tubo de choque é de diafragma simples e a quebra do mesmo é dada em função da diferencia de pressão entre a seção de alta e baixa pressão.
A figura 2 mostra a configuração básica de um tubo de choque de alta pressão, neste caso, uma configuração similar à configuração do tubo de choque de alta pressão da Universidade Nacional de Irlanda, em Galway, Irlanda. Este tubo de choque é de diafragma duplo e a quebra do mesmo é dada em função da diferencia de pressão entre a seção de alta pressão, uma seção de pressão intermédia e a seção de baixa pressão.
Operação de um tubo de choque
A figura 3 mostra as três principais etapas de um experimento na operação de tubos de choque. A figura 3(a) mostra o estado inicial, a linha azul representa a distribuição axial de pressão. Observe-se que existe uma descontinuidade na linha de pressão, representado a não-abertura do diafragma, as pressões são uniformes nas duas seções.
Em um teste de ignição, uma das duas seções tubulares é preenchida com a mistura reagente a ser analisada (seção de baixa pressão ou seção de teste) e a outra seção tubular é pressurizada com gases inertes, usualmente argônio e/ou hélio (seção de alta pressão). Num determinado tempo, o diafragma que conecta as duas seções se rompe, a diferencia de pressão resultante entre as duas seções gera uma serie de ondas de compressão se propagando na direção da seção de testes. Estas ondas de compressão colapsam em um intervalo de tempo e espaço muito curto logo depois da ruptura do diafragma, t = 0,0 s, formando uma onda de choque normal ao eixo de tubo, a qual vai se propagar na direção da mistura reativa. Esta onda, chamada de onda de choque incidente, propaga-se com velocidade supersônica na seção de baixa pressão, e põe o fluido detrás dela em movimento, na direção da onda de choque, com velocidade uiw, como mostrado na Figura 3 (a), e (b). Também, a figura 3 (b) e (c), mostra as distribuições axiais de temperatura (linha vermelha) e pressão (linha azul) depois de se abrir o diafragma, e no processo de propagação de onda incidente. Nesta etapa do processo os gases da seção de teste recebem o primeiro incremento de temperatura e pressão.
Detrás da onda incidente, a superfície de contato entre os dos tipos de gases contidos nas duas câmaras, alta e baixa pressão, movimenta-se também na direção da onda incidente, com velocidade ucs. A diferencia entre uiw e ucs permite que o gás de teste (mistura reagente a ser analisada) atinja as condições de alta pressão e temperatura (p5 e T5) detrás da onda refletida e antes que a superfície de contato altere as condições uniformes. Isto é representado na Figura 3 (d) e (e). Simultaneamente, na seção de alta pressão, uma serie de ondas de rarefação propagam-se em direção oposta dentro do gás de alta pressão. A figura 3 (d) e (e), mostra as distribuições axiais de temperatura (linha vermelha) e pressão (linha azul) depois da onda incidente chegar ao final da seção de baixa pressão (e ser refletida), no processo de propagação de onda refletida. Nesta etapa do processo os gases da seção de teste recebem o segundo incremento de temperatura e pressão.
Diagrama espaço-tempo (x-t) em tubos de choque
A chegada das ondas de rarefação também gera perturbações no gas de teste. O intervalo de tempo entre a chegada da onda refletida e a superficie de contato e o tempo disponivel para medições, Δt (ms), representado na Figura 4. Quando as condições em ambos os lados da superficie de contato sao favoraveis, a interação entre a superficie de contato e a onda refletida não gera ondas de choque adicionais, e a tendência da superficie de contato é a se manter em repouso. Este processo e chamado de “tailoring” do gas de alta pressão. Distribuições sucessivas de pressão no tempo, indicando a posição da onda de choque podem ser plotadas em um diagrama x-t, formando o diagrama tipico de espaço-tempo, como mostrado na Figura 4, e comumente encontrado na literatura (Saad (1993), Zel’dovich et al. (1966), Kee et al. (2000)).
Medições de atraso de ignição em tubo de choque
As figuras 1 e 2 acima mostram configurações de tubos de choque instrumentados para testes de ignição térmica em misturas reagentes. O evento de ignição e seguido rastreando a emissão de luz de uma especie quimica no momento da ignição, usualmente são usados o radical hidroxila, OH* (λ = 312 nm) ou o radical CH* (λ = 431,5 nm) como sendo especies indicadoras da ignição na mistura. A velocidade da onda de choque e medida em varios intervalos usando sensores de pressão. Os dados são entao armazenados em intervalos de tempo de 0,1 μs. A temperatura e pressão detras da onda de choque incidente e refletida (p2, T2, p5 e T5) são calculadas a partir do valor medido da velocidade de onda incidente, incluindo o efeito de atenuação, usando o código unidimensional SHOCK (SHOCK TUBE CODE – CHEMKIN, Kee et al. (2000)).
A figura 5 mostra os sinais de pressão e quimiluminescência obtidos num experimento de ignição térmica em tubo de choque. O atraso de ignição é definido como o tempo transcorrido entre a passagem da onda refletida, e o incremento da intensidade do sinal de quimiluminescência (CH*), como indicado na figura 5.
O atraso de ignição é definido como o tempo transcorrido entre a passagem da onda refletida, e o incremento da intensidade do sinal de quimiluminescência, como indicado na figura 5. Experimentos sucessivos, variando a espessura do diafragma (ou a pressão máxima na seção de alta pressão) e a pressão inicial da seção de baixa pressão, irão gerar valores de pressão e temperatura na condição 5 (condições de teste de interesse, similares às condições de temperatura e pressão em motores de combustão interna, por exemplo) os quais retornam valores de atraso de ignição em cada condição experimental de temperatura, pressão e estequiometria. Estes dados são organizados em forma de diagrama, e podem ser utilizados para posteriores validações de resultados numéricos usando mecanismos cinéticos detalhados, como mostrado na figura 6.
Neste tipo de figuras, usualmente no eixo y é dado o valor do atraso de ignição numa escala logarítmica e em microsegundos, no eixo x é dado o valor da temperatura em escala adimensional (1000 K / T) indicando que perto da origem estão os valores mais altos de temperatura e longe da origem os valores mais baixos. Usualmente são cobertos valores de temperatura entre 1250 K < T < 650 K.
Propagação da onda de choque – formação da camada limite: efeitos nas medições de atraso de ignição
Como escrito anteriormente, o rompimento do diafragma no tempo t = 0.0 s gera a propagação de uma onda de choque, inicialmente chamada de incidente e posteriormente onda refletida. A onda de choque incidente começa o seu deslocamento na direção dos gases de teste, atrás dela também vêem se deslocando a superfície de contato entre os gases de teste e os gases da seção de alta pressão (driver gases). Este processo de deslocamento da onda de choque gera a formação de uma camada limite, cuja espessura e influencia nas medições são diretamente proporcionais ao diâmetro do tubo de choque na seção de baixa pressão. A figura 7 descreve de forma ilustrativa este processo.
Na figura 7, a cor vermelha mostra o processo real, e a cor preta descreve a condição ideal, na qual não tem influencia da formação da camada limite. Pode-se observar nessa figura que existe um adiantamento da posição da superfície de contato e um atraso da posição da onda de choque em relação à condição ideal. Essa diminuição da distancia entre a superfície de contato e a onda de choque é função da formação da camada limite, pois esta retira massa da porção de fluido que está entre as duas (onda de choque e superfície de contato) promovendo a diminuição do espaço entre a onda de choque e a superfície de contato. No entanto, esta perda de massa promovida pela camada limite, tem certo valor máximo, a qual depende da própria configuração (espessura) da camada limite, e por sua vez, do diâmetro do tubo de choque.